sábado, 30 de agosto de 2025

[Opinião] A Rainha Ginga - José Eduardo Agualusa #552

Compre pela Amazon 


"Na manhã em que pela primeira vez vi a Ginga, fazia um mar liso e leve, tão cheio de luz que parecia que dentro dele um outro sol se levantava."
  José Eduardo Agualusa é um autor sobre o qual ouço elogios há muitos anos, este ano tive meu primeiro contato com sua obra em abril, quando li Teoria Geral do Esquecimento, provavelmente seu livro mais famoso. Gostei tanto que já providenciei outros para ler, dos quais o primeiro lido foi esse.
  A Rainha Ginga vai se passar no século XVII, durante a invasão portuguesa a Angola... Angola é um dos maiores países africanos e era o principal ponto de extração de escravos para o Brasil, na época que o Brasil ainda era colônia portuguesa... Angola continuou como colônia até 1975, quando enfim se tornou um país "livre", mergulhando imediatamente em uma ditadura socialista, da qual se livrou, pelo menos em teoria, na década de 1990... Na prática sofre com isso até hoje... 
  Mas o livro não vai falar sobre os dias atuais, e sim usar o pano de fundo da luta da mulher que ficou conhecida como Ana de Sousa, ou, rainha Ginga (N'Zinga M'Bandi). Ginga era a rainha herdeira de um reino africano localizado nos limites do que é hoje o pais de Angola, resistiu de diversas formas aos avanços portugueses que fundaram a cidade de Luanda e se estabeleceram ali para negociar escravos com os reinos locais, além de extração dos recursos do país, mas o principal objetivo era a obtenção de mão de obra escravizada, principalmente para ser enviada ao Brasil, como já mencionei.
  Ginga cria então, com uma aliança de outros reinos, o reino de Matamba, do qual passa a ser a soberana... Ela luta diplomática, política e militarmente contra os portugueses por boa parte da vida, mas no final, vencida pelo cansaço de lutar uma guerra perdida, ela faz um acordo. Os portugueses deixavam seu reino em paz e ela aceitava a colonização do país, além de ter se convertido ao catolicismo e até passado a negociar escravos com os colonizadores europeus.
  É um cima desse período da história que conhecemos Francisco José da Santa Cruz, nosso protagonista... um padre pernambucano em busca de uma justificativa pra sua apostasia, e ele vai encontrar isso quando vai para a Angola, chegando lá ele batiza Ginga, se encanta por uma mulher e logo a engravida, dá uma guinada de 180 graus na sua caminhada de fé e abandona a batina.
  A história que o autor criou para o livro mais atrapalha do que ajuda... é muito mais interessante conhecer a História real, que não aprendemos na escola, eu, pelo menos, nunca vi nada sobre a Angola nos meus tempos de estudante... inclusive, no livro também fala do período que os holandeses, ou flamengos, como são chamados aqui,  tomam boa parte do nordeste brasileiro... outra coisa que não sabia que tinha acontecido... eu sabia que eles haviam colonizado o nordeste, mas como os portugueses incentivavam a criação de colônias europeias no Brasil, achei que se tratava disso, e não de uma invasão e domínio... isso durou mais de duas décadas, durante as quais a população local foi quase dizimada, o que faz com que haja poucos descendentes de indígenas na região, em especial na parte que foi mais afetada pela invasão, a região de Pernambuco.
  Francisco é um protagonista muito pouco interessante, por vezes irritante, o que prejudica nossa experiência de leitura, sua história pessoal é até interessante, ao ser separado da mulher por quem se apaixonou (fácil demais, inclusive) e que esperava um filho seu, sem saber o que seria feito dela e como poderia reencontrá-la.
  É um livro onde o contexto é mais interessante que o texto, mas o autor escreve muito bem e consegue fazer o leitor se interessar, mesmo que com um protagonista muito pouco carismático.

Agualusa é um dos mais importantes escritores em língua portuguesa da atualidade. Nascido em Angola, mudou-se ainda jovem para Portugal, para estudar agronomia e silvicultura. Acabou alterando a sua carreira para o jornalismo, passando a colaborar para vários jornais. Sua obra foi traduzida para mais de 25 idiomas, e em 2016 foi um dos finalistas do Prêmio Man Booker, pelo romance Teoria geral do esquecimento.
É autor de romances, contos, novelas, livros infantis e peças de teatro. José Eduardo Agualusa acredita que os livros são um território de pensamento e a literatura é um exercício permanente de colocar-se na pele do outro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Talvez você goste de:



Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...