sexta-feira, 19 de março de 2021

[Opinião] Kafka à Beira-Mar - Haruki Murakami #333

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Editora: Alfaguara 

N° de Páginas: 571

Quote:
"A grande maioria dos acontecimentos é esquecida com o passar do tempo. Pouco a pouco, tanto a monstruosa guerra como a perda irreparável de preciosas vidas vão se tornando ocorrências de um passado distante. Nossas emoções são dominadas pelo cotidiano e muitos fatos de vital importância se distanciam do nosso consciente como estrelas velhas e geladas. Temos coisas demais para pensar em nossa vida diária, coisas demais para aprender. Novos sistemas, novos conhecimentos, novas técnicas, novo jargão... Por outro lado, existem lembranças que, por mais tempo que se passe e aconteça o que acontecer, não conseguiremos de maneira nenhuma apagar da nossa memória."

Sinopse:
  Kafka à Beira-mar é um dos romances mais ambiciosos do escritor japonês Haruki Murakami. Centrado na jornada de dois personagens em busca de autoconhecimento, é um livro imaginativo, com referências que vão do mundo pop às tragédias gregas.
  Kafka Tamura é um solitário menino de quinze anos que decide fugir da casa do pai para escapar de uma terrível profecia, além de tentar encontrar a mãe e a irmã, que partiram quando ele ainda era criança. Leva poucos pertences numa mochila e não sabe nem ao menos que rumo seguir.
  Sua rota de fuga irá se cruzar, inevitavelmente, com a de Satoru Nakada, um homem idoso que, após passar por um trauma inexplicável na infância, adquiriu estranhos poderes sobrenaturais. A odisseia desses personagens, tão misteriosa para eles quando para nós, será pontilhada por provações e descobertas, numa das mais surpreendentes obras da literatura dos últimos anos.

Opinião:
  Ah, Murakami!!!
  Acho que é meu dever começar dizendo que este é um livro estranho, em vários níveis... até para os padrões de Murakami... talvez sem superado apenas por Dance dance dance e O Assassinato do Comendador, esse último, inclusive, tem algumas semelhanças com o livro em questão, eu já sabia disso, mas não acho que seja algo relevante para essa postagem falar dessas semelhanças...
  Nesse livro acompanhamos dois núcleos de personagens que mais do que se cruzar vão se desencontrar... Satoru Nakada é um senhor um pouco estranho que ganha uns trocados encontrando gatos perdidos, pra isso ele conta com a ajuda de outros gatos, já que ele tem o estranho poder de conversar com eles, nao com animais no geral... só com gatos. A história dele é a que vai mergulhar mais profundamente no absurdo e a que terá os contornos mais chocantes e até com algumas pinceladas de horror.
  Mas confesso que a história do Kafkta Tamura me interessou muito mais. Kafka, que adota esse nome por causa do escritor, não ficamos sabendo seu verdadeiro nome, fugiu de casa em busca da sua mãe, que foi embora com a sua irmã quando ele era apenas um bebê, seu pai nunca se recuperou e um dia cai nas costas de Kafka a profecia de Edipo, e por isso ele foge de casa, para evitar que a dita profecia, aqui retratada mais como uma maldição, se cumpra. Se você tá boiando a maldição consistia em Kafka, um dia, matar seu pai e coabitar com a mãe e com a irmã...
  Nessa sua jornada em busca de, nem ele sabe direito o que, Kafka vai parar em uma biblioteca particular mas que é aberta ao público. É ali vai passar a maior parte da história.
  Personagens envolventes e uma narrativa reflexiva cheia de diálogos filosóficos é uma marca registrada do autor, e aqui não é diferente, além de, a meu ver, ser o livro mais crítico dele. E critico em diversos níveis. Mas devo dizer que adorei a resposta que um funcionário da biblioteca dá às dura feministas chamas que vão até lá, faço até questão de transcrevê-las abaixo:
"Veja bem, o que estou tentando lhe dizer é o seguinte: se a senhora dispõe de tempo suficiente para fuçar as pequenas bibliotecas particulares desta pequena comunidade em busca de impropriedades em banheiros e fichas catalográficas, use esse tempo para procurar outras questões, aliás abundantes, cujas soluções servirão para assegurar efetivamente o legítimo direito de todas as mulheres do nosso país. Nós qui nos dedicamos de corpo e alma a transformar esta modesta biblioteca numa instituição capaz de contribuir para o progresso da nossa pequena comunidade. [...] Peço-lhe portanto que, em vez de procurar o que não fomos capazes de realizar, procure o que fomos capazes de realizar. Esta seria a imparcialidade que apregoa, não seria?"

Melhor ainda o que a personagem fala depois, com uma conversa com o protagonista:
"As pessoas podem ser gays, lésbicas, feministas, fascistas, comunistas, hare krishna, nada disso me importa. Qualquer que seja a sua bandeira, não me importa. O que considero insuportável são pessoas vazias. Quando as tenho diante de mim, acabo falando mais do que pretendo, sem querer. Há pouco, por exemplo, eu devia ter deixado essas duas mulheres falar e quanto quisessem, devia tê-las tratado de maneira convencional. [...] Mas isso está acima de minhas forças. Esse é meu ponto fraco [...] Porque tratar com seriedade todas as pessoas desprovidas de imaginação é se desgastar infinitamente. [...]"
 
 E desse ponto a conversa continua, falando sobre pessoas de mentalidade tacanha, teorias infundadas e ideais usurpados.
  Nessa jornada de autodescoberta de ambos os protagonistas teremos várias conversas parecidas, o que nos faz pensar que a imbecilidade coletiva está sim crescendo, mas felizmente a sensatez tem seus remancentes.





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